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terça-feira, 4 de julho de 2017

A Outra Cultura

Em 1959, o cientista e romancista C. P. Snow proferiu uma palestra mais tarde publicada com o título The Two Cultures (As Duas Culturas). Nessa palestra, C. P. Snow lamenta a separação entre as ciências e as humanidades e o desconhecimento dos praticantes de uma das áreas em relação à segunda. 

Abaixo incluo alguns excertos da palestra de Snow (a tradução é minha):
Acredito que a vida intelectual de toda a sociedade ocidental se encontra cada vez mais dividida em dois grupos polares. (...) Os intelectuais literários num pólo - no outro os cientistas, sendo os mais representativos os cientistas físicos. Entre os dois um abismo de incompreensão mútua - por vezes (particularmente entre os jovens) hostilidade e antipatia, mas principalmente falta de compreensão.
Várias vezes estive presente em reuniões de pessoas que, pelos padrões da cultura tradicional, são vistas como altamente instruídas e que têm exprimido com considerável fervor a sua incredulidade com a iliteracia dos cientistas. Uma ou duas vezes os provoquei e perguntei quantos deles conseguiam descrever a Segunda Lei da Termodinâmica. A resposta foi fria: foi também negativa. E no entanto eu perguntara algo que é aproximadamente o equivalente científico de: já leu alguma obra de Shakespeare?

Não pretendo com a reprodução destes excertos acusar os "intelectuais literários" de ignorância científica; o próprio Snow reconhece que também a maioria dos cientistas exibem falhas severas no seu conhecimento das humanidades.

Pretendo, isso sim, chamar a atenção para um fenómeno com o qual me tenho deparado e em relação ao qual sou particularmente sensível, dada a minha formação como matemático. Trata-se da visão redutora que o público em geral tem do termo "cultura". Já não me refiro ao facto de a "cultura geral" ser vista muitas vezes como um agregado desconexo e quase acéfalo de factos memorizados, sem qualquer cimento intelectual que os relacione (associar a data de 1143 à fundação da nacionalidade sem qualquer noção do contexto histórico associado; saber que Luís de Camões escreveu Os Lusíadas ou que Eça de Queirós escreveu Os Maias sem qualquer conhecimento destas obras; os exemplos são inúmeros).

Refiro-me mais propriamente à exclusão das ciências e, em especial, da Matemática, da noção usual de cultura. Quantas pessoas considerarão, usando o exemplo de Snow, a Segunda Lei da Termodinâmica como fazendo parte da cultura ("geral" ou não) de um indivíduo? Ou o teorema de Pitágoras (tantas vezes enunciado como uma lenga-lenga sem qualquer contexto)?

Um exemplo desta exclusão das ciências daquilo que constitui o "cânone cultural" pode identificar-se de forma particularmente evidente no livro (ambiciosamente intitulado) Cultura: Tudo o que é preciso saber, do escritor e ensaísta alemão Dietrich Schwanitz. Trata-se de um livro com várias centenas de páginas que inclui assuntos de História, Literatura, Arte, Filosofia, mas uma notável escassez de assuntos científicos. Há alguma menção à evolução das concepções do universo e umas poucas dezenas de páginas onde se passam em revista a teoria da evolução por selecção natural e a teoria da relatividade (sem que haja uma descrição minimamente rigorosa de qualquer das duas). Entende-se que a Biologia ou a Física não sejam as áreas que o autor domina; entendo menos a decisão de, mesmo com estas lacunas, dar o subtítulo "tudo o que é preciso saber" a um livro de onde o entendimento científico do universo, um dos maiores feitos da humanidade, esteja quase ausente. Isto para não falar na Matemática, que no livro mencionado tem uma expressão ainda menor que a das ciências físicas e naturais.

Mas sobre a Matemática e o seu papel na cultura mais há que dizer. O desconhecimento dos conceitos mais elementares da Matemática é uma das lacunas culturais e intelectuais mais facilmente perdoáveis que podemos encontrar. Quantas vezes nos horrorizamos com erros ortográficos sérios ou nos indignamos com o desconhecimento de personalidades histórias e artísticas nacionais ou internacionais? E, no entanto, quantas vezes não reagimos com um sorriso benévolo e compreensivo perante alguém que não sabe somar fracções, reconhecendo com um encolher de ombros "nunca fui bom a Matemática"? A ignorância matemática ganha assim uma aceitação social de que poucas outras formas de ignorância gozam, o que não pode senão perpetuar essa mesma ignorância, num ciclo vicioso de desconhecimento e complacência.

Porque é que a teoria da evolução por selecção natural de Darwin, uma das peças fundamentais na compreensão da nossa condição como seres vivos, não é encarada como uma componente pelo menos tão essencial da cultura como o conhecimento dos principais elementos da História de Portugal? Porque é que uma compreensão mínima do papel que Euclides desempenhou na concepção da Matemática não é exigida como requisito de cultura, a par do conhecimento dos grandes escritores nacionais, como Camões, Eça, Pessoa ou Saramago?

É verdade que existe o reverso da medalha, e não seria honesto não o referir. Também, em múltiplas ocasiões, tive oportunidade de encontrar quem acusasse o estudo da Filosofia e da Literatura de inutilidade no currículo de um estudante das ciências. Trata-se de uma posição igualmente atentatória à formação cultural integral do indivíduo. O facto é que o afastamento das ciências e das humanidades é prejudical a todos, como alertou C. P. Snow.

Não serão afinal as ciências, como fruto do intelecto humano, também humanidades?

terça-feira, 27 de junho de 2017

Parecer sobre o Exame Nacional de Matemática do 9.º ano (1.ª fase 2017)

Vou deixar aqui também o meu parecer sobre o exame nacional de Matemática do 9.º ano. É mais raro resolver este, mas em anos recentes tenho-lhe prestado alguma atenção. 

O enunciado do exame pode ser encontrado em:
Os critérios de correcção podem ser encontrados aqui

Parecer sobre o Exame Nacional de Matemática do 9.º ano

Caderno 1

O primeiro caderno do exame inclui itens que devem ser resolvidos em 35 minutos (com 10 minutos de tolerância), sendo permitida a utilização de calculadora.

O item 1 é de resolução muito simples, bastando conhecer as notações comuns para intervalos. Não se justifica a presença deste item numa prova com uso de calculadora; os alunos do 3.º ciclo aprendem a calcular aproximações de números irracionais como é o caso de $\sqrt{5}$; o uso da calculadora permite obter imediatamente uma aproximação da representação decimal deste número, tornando a questão muito simples.

O item 2 é também muito simples. É dado algum contexto para a questão, mas este acaba por ser irrelevante, visto que o item explica em detalhe o que o aluno deve fazer. 

O item 3 é também de dificuldade reduzida. No entanto, não acho que o diagrama de caule-e-folhas representado seja rigoroso, uma vez que não é indicada em parte alguma a ordem de grandeza dos caules e das folhas; resta ao aluno interpretar o diagrama da única forma que permitiria dar uma resposta correcta, vendo os caules como dezenas e as folhas como unidades. Continua a ser uma imprecisão lamentável.

O item 4 é uma aplicação quase imediata das razões trigonométricas, não apresentando, à semelhança dos itens anteriores, grande dificuldade.

O item 5.1 é também imediato.

O item 5.2.1 é uma aplicação imediata do teorema de Pitágoras. 

O item 5.2.2 não tem grande dificuldade. O maior obstáculo para o aluno poderá ser a orientação no meio de tantas letras que identificam pontos da figura, mas ultrapassado este obstáculo, trata-se de um problema simples de semelhança de triângulos e de cálculo de um volume simples.

Apreciação geral do caderno 1:
  • O caderno 1 tem uma dificuldade geral muito reduzida, especialmente tendo em conta que é resolvido com uso da calculadora. Não havia um único problema que exigisse mais do que a aplicação imediata de factos e conceitos que o aluno deve conhecer.
Caderno 2

O segundo caderno do exame inclui itens que devem ser resolvidos em 55 minutos (com 20 minutos de tolerância), não sendo permitida a utilização de calculadora.

O item 6.1 é uma questão trivial de probabilidade. Pode induzir em erro alguns alunos que considerem que há 5 hipóteses de escolha, pensando nas sessões de divulgação e não nas salas. Tirando este detalhe, a resposta é imediata.

O item 6.2 é uma questão de probabilidade um pouco mais difícil que a questão anterior; mesmo assim, não deverá ter um grau de dificuldade muito distinto do grau médio de dificuldade dos exercícios treinados pelos alunos em aula. O exercício sugere inclusivamente aos alunos métodos possíveis de resolução, quando estes deveriam ter a sensibilidade necessária para reconhecer o método a usar nesta situação.

O item 7 requer alguma reflexão e algum cuidado na exposição da resposta. Uma vez mais, o grau de dificuldade do exercício é diminuído pelo excesso de indicações no enunciado: é dito que "cada termo da sequência, com excepção do primeiro, tem mais três círculos do que o termo anterior", o que faz com que o aluno não tenha necessidade de identificar este padrão por si mesmo, a partir da figura.

O item 8 é uma questão imediata sobre proporcionalidade inversa.

O item 9 envolve dois passos distintos: o primeiro requer o conhecimento da noção de função e a aplicação da expressão de uma função na determinação das coordenadas de um ponto; o segundo requer apenas o cálculo de uma área simples. Nenhum dos passos apresenta grande dificuldade, mas é necessário interpretar correctamente a figura para reconhecer como proceder na resolução do exercício.

O item 10 é uma questão simples que envolve apenas a resolução de uma equação quadrática que se encontra já escrita na forma que permite uma aplicação imediata da fórmula resolvente.

O item 11 corresponde à resolução de uma inequação linear. Envolve algumas manipulações algébricas, pelo que não é um exercício imediato.

O item 12 é muito simples. Uma das equações do sistema dado corresponde a uma recta horizontal e a outra corresponde a uma translação da recta de equação $y=-x$, facilmente reconhecível.

O item 13 requer apenas a manipulação de uma expressão numérica com potências de expoente negativo, exigindo apenas o conhecimento das regras de operações com potências.

O item 14 é imediato; basta conhecer a fórmula da diferença de quadrados (um dos "casos notáveis" da multiplicação de binómios).

No item 15, a linguagem usada pode causar alguma dificuldade, especialmente para alunos menos habituados a criticar afirmações matemáticas.

O item 16 não é muito difícil, exigindo apenas o conhecimento de alguns factos geométricos simples.

O item 17 é de resolução imediata.

O item 18 padece do mesmo problema que outros itens do exame: poderia ser uma questão "de selecção" com dificuldade apropriada, mas o excesso de indicações diminui bastante o grau de dificuldade do exercício. Poderia simplesmente ser pedido ao aluno que indicasse, justificando, se a afirmação é verdadeira ou falsa. 

Apreciação geral do caderno 2:
  • À semelhança do que aconteceu com os itens do caderno 1, praticamente não existem exercícios de dificuldade superior no caderno 2. As questões são quase todas de resolução imediata por aplicação de conceitos dados. Nas questões onde o grau de dificuldade poderia ser superior, o excesso de indicações reduz esse grau de dificuldade, tornando-as em questões quase imediatas.

sexta-feira, 23 de junho de 2017

Parecer sobre o Exame Nacional de Matemática A (1.ª fase 2017)

Desde que realizei pela primeira vez o exame nacional de Matemática A, quando concluí o 12.º ano (em 2008, portanto), tenho mantido a tradição de, todos os anos, consultar e resolver este mesmo exame, pelo menos a versão da 1.ª fase de exames. Todos os anos exprimo para mim ou entre colegas de curso a minha opinião sobre o exame: o grau de dificuldade, as peculiaridades de algumas questões,...

Este ano, aproveitando a existência deste blogue, decidi tornar pública a minha opinião. Vou aqui deixar o meu parecer sobre o exame de Matemática A (Prova 635); este tem o valor que tem, é simplesmente a opinião de alguém cuja única vantagem sobre a generalidade das pessoas é um conhecimento mais aprofundado de Matemática, nada mais.

Aqui fica, para quem tiver interesse nele. O enunciado do exame pode ser encontrado em:
Os critérios de correcção podem ser encontrados aqui.

Parecer sobre o Exame Nacional de Matemática A 

Grupo 1

O item 1 é uma questão elementar de Combinatória, não tendo um grau de dificuldade superior ao que é habitual ser trabalhado neste assunto no 12.º ano.

O item 2 é, como tem vindo a ser costume, uma questão sobre Probabilidade que envolve a mobilização do conhecimento da fórmula que define a probabilidade condicionada. Ao contrário de exames anteriores, em que este item envolve acontecimentos abstractos e alguma informação é dada sobre a probabilidade destes, no exame deste ano esta questão envolve uma uma situação concreta, o que acrescenta a dificuldade de interpretar correctamente os dados fornecidos.

O item 3 é de resolução simples, desde que se tenha em mente a interpretação geométrica da segunda derivada de uma função num ponto como indicadora do sentido da concavidade do respectivo gráfico.

O item 4 exige alguns conhecimentos sobre a determinação de assímptotas oblíquas. Pela especificidade do tema e pelo facto de o limite apresentado necessitar de alguma reflexão, considero que o item tem uma dificuldade ligeiramente acrescida.

O item 5 é uma questão bastante directa sobre Trigonometria que exige, ainda assim, alguma atenção.

O item 6 requer alguma familiaridade com as relações entre as funções trigonométricas. Apesar de não ter um grau de dificuldade elevado, algum à-vontade com o assunto é desejável para que o problema possa ser abordado de forma correcta.

O item 7 não é inteiramente directo. Requer a identificação correcta de uma dada região do plano complexo para que a sua área possa ser determinada. A interpretação errada das condições dadas pode levar a confusão na posterior determinação da área, daí que o considere um item de dificuldade média. 

O item 8 é uma questão sobre sucessões, tema de 11.º ano; por esta razão, pode ter sido considerado por alguns como mais difícil, especialmente porque requer o conhecimento de alguma terminologia que tem tendência a ser descurada (não é costume insistir-se muito no conhecimento de definições precisas de conceitos na Matemática do ensino secundário, infelizmente). 

Apreciação geral do Grupo I
  • O grupo I do exame corresponde, em grande medida, ao que tem sido costume em exames de anos anteriores, à excepção de uma ou duas questões de carácter um pouco diferente. O grau de dificuldade, em termos matemáticos, não é muito elevado. 
  • É de salientar a presença de questões que, mais do que a capacidade de cálculo, exigem o conhecimento de conceitos e factos; estes, apesar de elementares, podem não ser completamente dominados por quem se preparou para o exame resolvendo exercícios de natureza mais "calculatória". É uma opção com a qual concordo, se bem que a natureza destes exercícios e a sua relativa novidade podem ser um factor que leve os alunos a considerar este grupo um pouco mais difícil.

Grupo 2

O item 1 é típico de quase todos os exames nacionais de Matemática A que me vêm à memória: um exercício sobre números complexos que envolve, essencialmente, cálculos e conversões entre a forma algébrica e a forma trigonométrica de um número complexo. Há alguma novidade no que é pedido e a questão não é tão directa como por vezes acontece (é referida a distância entre dois complexos). Também pode causar alguma dificuldade o facto de ser mais útil ter os complexos dados na forma algébrica (ao contrário do que é usual nestes exercícios), mas o complexo $z_1$ ser um quociente de complexos, usualmente mais fácil de calcular na forma trigonométrica.

O item 2.1 é de resolução praticamente imediata (desde que o aluno não interprete "raio" em vez de "diâmetro" na questão).

O item 2.2 também tem uma resolução simples. Se o aluno determinar as componentes dos vectores dados (o que não é difícil, por serem vectores directores de um eixo coordenado), o cálculo do produto interno é muito simples. Se for usada a fórmula que envolve as normas dos vectores e o seu ângulo, é necessário ter apenas em atenção os sentidos opostos dos vectores (o que torna o produto interno negativo).

O item 2.3 envolve apenas manipulações usuais com equações de planos e rectas no espaço e não apresenta dificuldade para quem preparou bem o assunto.

O item 2.4 é interessante na medida em que envolve Probabilidade e Geometria. Não é novidade; já em exames anteriores, se bem me recordo, tal aconteceu (pelo menos em exames nacionais antigos, nos quais também surgiam questões sobre Geometria). A maior dificuldade é a contagem cuidadosa dos casos favoráveis, que torna o item no mais difícil de entre os que constituem o item 2. Devo confessar que a expressão para o número de casos favoráveis que consta dos critérios de classificação não é, para mim, a mais "natural", mas isso é uma questão inteiramente pessoal.

O item 3 também é relativamente comum no contexto dos exames nacionais de Matemática A. A novidade (e a dificuldade) do exercício está no facto de a probabilidade pedida vir em função de uma variável desconhecida (o número $n$ de bolas no saco). Esta opção faz com que o exercício tenha necessariamente de ser resolvido através de algum raciocínio e não apenas uma contagem elementar directa dos casos possíveis e favoráveis.

O item 4.1 envolve alguns cálculos directos mas potencialmente morosos. A dificuldade deste item, no entanto, não está nos cálculos, mas na interpretação que é pedida dos resultados. Não só não é completamente imediato pela expressão dada o que esta significa (tem um aspecto de distância, mas o facto de cada um dos pontos envolvidos ter uma coordenada nula simplifica a expressão e torna-a menos transparente), como não é evidente qual a utilidade do resultado obtido no contexto do problema. Qual é o interesse de conhecer o ponto à superfície do rio que está a uma distância de 2 metros do ponto inicial da ponte? Parece-me que o exercício foi concebido com a intenção de existir um item de "modelação" de uma situação real no exame (o que é de louvar). No entanto, como tantos outros exercícios "em contexto real", sai o tiro pela culatra e a aplicação tem um aspecto artificial, sem interesse aparente, "montada" apenas para os propósitos do exercício.

O item 4.2 também envolve a interpretação da situação dada e tem muito mais interesse do que o item 4.1, não padecendo do mesmo mal. É, a meu ver, um item bem conseguido na medida em que exige a aplicação do cálculo diferencial sem que isso seja completamente óbvio pelo enunciado. Para além disso, o item tem uma dificuldade apropriada em termos da complexidade da função dada e em termos do cálculo do zero da derivada (apesar do aspecto complicado, o cálculo do zero da derivada revela-se simples). 

O item 5.1 é usual em exame. Está construído de forma a poder avaliar o conhecimento de dois limites notáveis. Os cálculos dos limites envolvem mudanças de variável em ambos os casos; não sendo limites difíceis para quem treinou o assunto, no contexto da prova pode ser excessivo inserir um exercício tão moroso. 

O item 5.2 reduz-se a uma equação trigonométrica relativamente simples. Não apresente dificuldades de maior.

O item 5.3, de utilização da calculadora gráfica. Sou usualmente céptico em relação ao conteúdo matemático realmente avaliado por este género de exercício, mas tem sido frequente nos últimos anos que estes itens não se reduzam ao uso da calculadora, mas exijam também alguma reflexão prévia. O mesmo acontece com esta prova. No entanto, questiono a utilidade deste exercício numa prova já relativamente longa e com vários itens que exigem alguma reflexão. (Talvez os alunos se sintam defraudados caso gastem dinheiro com uma calculadora que se revele praticamente inútil no exame a não ser para o uso de auxiliares de memória electrónicos?)

O item 6 vem dar continuidade à prática, usual nos últimos anos, de incluir no exame uma questão mais difícil, normalmente pela sua natureza mais teórica ou abstracta ou pela exigência de pensar "fora da caixa". É uma prática que costumo subscrever. Não sei até que ponto isso foi bem conseguido neste item. Ao contrário do que já aconteceu, o exercício envolvia mais a manipulação de expressões algébricas (não inteiramente directa, até porque existiam várias formas de abordar o problema) do que propriamente a compreensão de conceitos matemáticos, o que talvez fosse uma melhor opção para um exercício desta natureza. 

Apreciação geral do Grupo II
  • O grupo II do exame tinha uma dificuldade moderada, consequência sobretudo do facto de haver uma quantidade razoável de questões "indirectas" nas quais a obtenção da resposta passa por um misto de compreensão dos conceitos envolvidos no problema e realização de vários passos mais ou menos elementares. Parece-me boa ideia que assim seja, mas a tentativa de manter o exame nos moldes dos exames dos anos anteriores enquanto, simultaneamente, se aumenta o grau de dificuldade de alguns itens, ainda que ligeiramente, pode fazer com a prova se torna cansativa ou mesmo demasiado longa para o tempo prescrito. Neste caso em particular, sinto que o item 2 poderia ser reduzido (um dos três primeiros itens poderia ser omitido, por exemplo), o item 4.1 deixa muito a desejar e poderia ser omitido e algum dos itens que constitui o item 5 poderia ser também omitido (o item 5.2 ou mesmo o item 5.3 de utilização da calculadora). 
  • É de louvar a introdução de exercícios que exijam a interpretação de situações mais concretas, por oposição a itens que apelem apenas à memorização de procedimentos, mas é necessário fazer um esforço para que as situações incluídas sejam substanciais do ponto de vista da modelação. 
  • É também de louvar a tentativa de uma maior integração entre os conteúdos do programa. É importante que a Matemática não seja vista como uma área fragmentada em assuntos disjuntos. 
  • A "questão de selecção" (item 6) poderia ter sido mais bem conseguida. 

Termino aqui, espero que este (longo) artigo sobre o exame seja de interesse para alguém. Dada a subjectividade inerente a muito do que escrevi, estou aberto, naturalmente, a correcções e a opiniões discordantes. 

terça-feira, 20 de junho de 2017

Um blogue que é e não é novo

Este não é um blogue novo. De facto, foi criado há mais de um ano, com intenção de ser um repositório de pensamentos, opiniões e tudo o mais que eu decidisse incluir. 

Várias circunstâncias fizeram com que não pudesse dedicar-me ao blogue como desejava e, quando pude novamente fazê-lo, senti que necessitava de um recomeço. Assim nasceu o Automorfismo, o meu blogue sobre Matemática, onde comecei a fazer algumas tentativas de divulgação matemática dirigida a estudantes do ensino secundário. 

Agora, sinto a falta de um espaço onde possa registar a minha opinião e os meus pensamentos sobre assuntos não necessariamente relacionados com Matemática. Decidi então ressuscitar e reiniciar o Dimensão Infinita. 

Assim, aqui estou, num blogue que é e não é novo. Espero que aquilo que tenho para dizer, que tem interesse para mim mesmo, possa ser também do interesse de quem me leia. 

Até breve, espero.